30.3.09

“Quando os gatos saem, os ratos fazem a festa”

Estou caminhando pelo bairro onde moro como exercício para o físico e para alma. Ouço música, canto e penso em solucionar os problemas do mundo. Os meus primeiros, é claro! Por mim passam pessoas de todos os tipos, exercitando-se ou não.

Em um determinado momento, vejo duas meninas com jeans e mochilas, que devem estar a caminho ou saindo do colégio ou da recém iniciada graduação. Elas conversam e caminham devagar. Em mais algumas passadas rápidas, sei que as ultrapassarei.

Antes de mim e de frente para elas um menino negro, vestindo uma camisa suja e listrada, uma bermuda e descalço, vai de encontro e fala para elas alguma coisa, que o fone de ouvido me impede de escutar. Sinto um calafrio, um susto. É um assalto ou um pedido de dinheiro? Que diferença faz mesmo?

Meu coração acelera ainda mais. Eu tremo. O fone de ouvido toca uma música que não ouço. Quero correr e chorar, mas continuo. Rapidamente, pego o celular e penso no telefone da polícia. Não lembro. Não sei. Não uso. Chego mais perto. Passo por elas e não as vejo abrir a mochila. Continuo, olhando para trás. Elas respondem e passam pelo menino. Olham para mim. Sabiam que eu estava de olho. A conversa e a caminhada delas continuam. A minha também.

Penso que na próxima curva vou chegar no carro da polícia que sempre está lá. Caminho rápido e não encontro. É hora de almoço. Todos temos direito, mas poderia existir escala. O velho ditado se cumpre.

Aline Gama

26.3.09

Há beleza no olhar



Entardecer de 2008 na Ilha do Fundão. Fotografado com celular por papai, José Pedro.

Aline Gama

23.3.09

Aqui & lá

Entro, sinto o ar gelado e sento, enquanto penso em tanta coisa que nada mais existe. De repente, ouço uma batida do meu lado direito que me desperta, mas só movo os olhos. Estou no metro, um menino e uma menina sentam ao meu lado e seus pais ficam em pé de frente para eles. Ele aponta para o símbolo, inscrito em um plástico azul.

- É do McDonald, acabei de ganhar...
- No Mac Lanche Feliz? Como funciona?
- É só mexer que sai o som, tem 03 tipos de...

Não presto mais atenção ao que ele diz, só percebo seu sotaque, mas não reconheço. O Brasil é um país grande. O que eles devem estar fazendo aqui? Visitando a família, conhecendo a cidade violenta e também Maravilhosa, indo a praia, ao cinema. Aparentam cansaço. São quase nove horas da noite de um sábado chuvoso. Devem ter passado a tarde em um shopping: cinema, pipoca, refrigerante, brinquedos, brinquedos, lanche e casa.

- Hum, bacana! Me deixa tentar? Gostei. Você tem sotaque. Você é de onde?
- Do sul...
- Você está aqui de férias?
- Não, férias é lá.
- Hum, quanto tempo você mora aqui?
- Tempo? Hum, tempo eu não sei...

Ele tem respostas ótimas para perguntas tão óbvias. Não ter noção da passagem do tempo e seguir o fluxo biológico é uma das melhores coisas da vida! Ouço ao fundo "I´m yours" no celular de alguém no vagão.

- Você já começou a aula?
- Já.
- Ano passado você estudou aqui ou lá?
- Aqui.
Era o que eu precisava saber...
- E você gosta mais daqui ou de lá?
- De lá!

Bingo! Era só isso que eu queria ouvir, além da música.

Aline Gama

19.3.09

Luz e sombra sobre o Centro



Foto do celular: Aline Gama

16.3.09

Entre fios - parte II

- Você, que é ligada na arquitetura urbana, deve ter percebido como é isso aqui.
- Hum...
- É uma bagunça!
- Você olha para cima e vê essa quantidade absurda de fios. Não é à toa que de vez em quando acontece um incêndio.


Bagunça somos nós. Uma quantidade de fios que não se deixa perceber, sentimentos contraditórios, fios de sangue e de tecidos, mas nada causa incêndio. Tudo está em suspensão. Andamos por um.

- E se você olha para os prédios você vê que embaixo é uma coisa. Uma loja de roupas, de móveis, de comida... Tem de tudo! E em cima alguns têm um sobrado colonial caindo aos pedaços, outros pintaram e destruíram a fachada, transformado em qualquer outra coisa. É um crime isso! Essas pedras antigas são as mesmas do Pão de Açúcar. É uma raridade, mas aqui é uma zona. Cada um faz o que quer. Para mim, isso aqui é uma grande favela urbana.

Passado e presente se digladiam. O passado se enlaça pelos fios de eletricidade, de internet e de telefone ao presente das lojas de comidas a eletrodomésticos. Os fios são e estão no meio. Enlaçam, como os molhos da culinária, vista por Freyre e DaMatta. É assim que nos expressamos em nossa arquitetura. Concordo com você: a cidade é uma favela que se quer Maravilhosa. Dá-se um jeito. Perde-se o passado e tudo aquilo que poderíamos ter sido!

- Você conhece essa Igrejinha?
- Não. Você sabe de quem é?
- Não.
- Vamos entrar?
- Vamos.
- De fora você vê que esse camelô fez um furo e colocou um gancho para a sua lona.
- Que isso! Que absurdo!
- É assim! Ninguém toma conta de nada. Não existe regra e não existe vigilância.


Ele passa para a minha direita e fica para trás....Perco o de vista em uma Igreja tão pequenina. Caminho só até o altar para ter outra perspectiva da Igreja e ver de lá a Santa. Fico a olhar. Sagrado e profano invadem um ao outro em mim e em toda arquitetura da cidade. Uma profusão de entidades, santos, deuses, mestres em meio a discípulos pecadores. Não só no SAARA a ilegalidade é vizinha de porta do sagrado. Rapidamente, percebo estar só em um lugar que não desejo mais ficar. Apenas caminho para única saída que conheço.

Aline Gama
Entre fios - parte I

12.3.09

Forwarded message II - Rio de Janeiro em 1967



"O helicóptero pertencia à antiga Companhia VOTEC (Voos Técnicos e Executivos), facilmente identificada pela logo-marca. Foi a primeira empresa contratada para efetuar voos para as plataformas marítimas da PETROBRAS. Trata-se de um clip gravado durante a produção do filme "Roberto Carlos em ritmo de aventura", elaborado em plena época da Jovem Guarda. Na travessia do Túnel Novo, o trânsito foi interrompido e pode-se ver alguns veículos aguardando o término da acção. Ainda não existiam a Torre do Rio Sul ou o Condomínio Morada do Sol. A Avenida Atlântica possuía, apenas, uma pista de rolamento. Ao passar pela Cinelândia (Avenidas 13 de Maio e Rio Branco) pode ser visto o antigo Senado Federal (conhecido como Palácio Monroe) demolido durante as obras do Metrô Rio (não perguntem por quê).

O pouso foi feito no prédio do antigo Banco do Estado da Guanabara, hoje, Banco Itaú S.A., na Avenida Nilo Peçanha, provavelmente, o único heliporto existente, então, no centro da cidade. Naquela época que deixou muitas saudades, o Rio de Janeiro era chamado de Estado da Guanabara. O piloto que realizou este voo já faleceu e pelas normas actuais de segurança seria impossível realizar um procedimento semelhante. Até hoje se elogia a habilidade do piloto em passar pelo túnel, em uma única passagem, sem um treinamento mais específico...

Rodrigo Fernandes Lima."

Veja também o vídeo Rio de Janeiro em 1936!
Ctrl+c,Ctrl+v de e-mail, Aline Gama

9.3.09

Há inteligência no poder?

Foi notícia na sexta, dia 05 de março, no SBT-Rio, que uma quadrilha de assaltantes foi presa. Nas filmagens, os quatro homens tinham marcas de tortura. Antes de serem achados pela polícia, foram pegos pelo tráfico e torturados, pois o assalto que vira notícia, como todos nós sabemos, prejudica o comércio de drogas nas favelas próximas porque chama os policiais a ação. A polícia, além de inibir os negócios, pede arrego* para não acabar com o tráfico local. Sendo assim, a lei do tráfico é: atrapalhou os negócios, paga com tortura ou muitas vezes com a própria vida como aconteceu com os dois assaltantes de André. Segundo a mesma notícia, eles também foram mortos pelo tráfico.

Ao conversar com qualquer morador de favela do Rio, ele pode contar que os traficantes sabem quando a polícia vai agir. Eles se preparam para o confronto, escondendo aonde podem a maioria das drogas, informações dos negócios e armamentos, deixando que a polícia apreenda alguma coisa. A polícia mostra nos jornais, que também foram avisados da ação policial, as armas, as drogas, os números de presos e mortos.

Mas a ação quase nunca resolve a questão porque é pontual. O comércio se restabelece rapidamente. Quando a polícia sai do local, novas drogas e armamentos são adquiridos através da corrupção que se espalha por toda a cidade. Os traficantes, crianças e adolescentes mortos, que viram números nos institutos de pesquisa, são substituídos.

Gráficos estatísticos extremamente complexos cruzam informações de faixa etária com cor da pele, profissão e local de moradia para dizer que o comércio, que continua ilegal, continua matando. Com tais informações, os institutos elaboram novos projetos, financiados pelo governo, que se propõem a continuar a contagem do número de mortos em detalhes sórdidos. O mesmo governo também financia a inteligência e a força policial. O dinheiro do financiamento é adquirido com empréstimos internacionais que serão pagos com os impostos.

Além de pagar pela ação da polícia e pelos institutos de pesquisas, também pagamos as ONGs e os tratamentos de saúde daqueles que não morreram, mas sofreram física ou psicologicamente com a violência cometida. Os adolescentes e crianças que ganham R$500,00 em uma semana, pagam o arrego dos policiais e sabem que se forem pego não ficarão presos, não trocam a curta vida do tráfico por bolsa família, bolsa escola, bater lata, dançar ou jogar bola em alguma ONG. O governo, que financia ONGs, institutos de pesquisas e ações policiais, não tem verba para competir com o apelo financeiro do tráfico.

No entanto, institutos de pesquisa e inteligência policial já adquiriram conhecimento do território, dos diferentes agentes e locais de ação do tráfico, mas não propõem novas estratégias de ação. Assim, o modo de produção industrial do tráfico continua. Se há alguma inteligência, ela é usada para manter essa rede de produção e comércio, pois usar armas e diferentes tipos de violência física para combate está longe de ser uma medida eficiente.

Aline Gama
* tipo de suborno usado pelo tráfico com drogas e dinheiro para o policial não prender e impedir a venda de drogas.

5.3.09

Elegia da rebeldia

"Eu não gosto do bom gosto
Eu não gosto de bom senso
Eu não gosto dos bons modos
Não gosto

Eu agüento até rigores
Eu não tenho pena dos traídos
Eu hospedo infratores e banidos
Eu respeito conveniências
Eu não ligo pra conchavos
Eu suporto aparências
Eu não gosto de maus tratos

Mas o que eu não gosto é do bom gosto
Eu não gosto de bom senso
Eu não gosto dos bons modos
Não gosto

Eu agüento até os modernos
E seus segundos cadernos
Eu agüento até os caretas
E suas verdades perfeitas

O que eu não gosto é do bom gosto
Eu não gosto de bom senso
Eu não gosto dos bons modos
Não gosto

Eu agüento até os estetas
Eu não julgo competência
Eu não ligo pra etiqueta
Eu aplaudo rebeldias
Eu respeito tiranias
E compreendo piedades
Eu não condeno mentiras
Eu não condeno vaidades

O que eu não gosto é do bom gosto
Eu não gosto de bom senso
Eu não gosto dos bons modos
Não gosto

Eu gosto dos que têm fome
Dos que morrem de vontade
Dos que secam de desejo
Dos que ardem
"

Música da Adriana Calcanhoto, que eu queria ter escrito, está tocando muitas vezes por dia na minha mente e no meu som porque a morte ainda dói.

Aline Gama

2.3.09

Cidade das cores







Aline Gama
Fotos 1 e 2 de Aline Gama do Zoo Bloco, dia 24.02.
Fotos 3 e 4 de A.G. e Eduardo Starling(4a.) do Exalta Rei, dia 23.02.